segunda-feira, 3 de junho de 2013

Antes da viagem uma Maratona de Revezamento

Um dia antes da Viagem

Caros amigos desculpem não ter relatado a viagem enquanto ela ocorria. Tive problemas técnicos de diversas ordens. Levei apenas o IPad e ele não conversou bem com o blog,  quando eu conseguia escrever algo não era possível enviar. Perdi horas tentando e decidi juntar o material e publicar assim que chegasse, mas antes de iniciar com a viagem tenho de contar a saga da prova de Revezamento Bertioga/Maresias, que participei em 18/5, um dia antes de embarcar para aventura off shore.
Essa é uma das mais charmosas provas de corrida que participei, o percurso passa pelas mais belas praias do litoral norte de São Paulo. São 75 km. A largada foi do Forte de Bertioga, de lá Riviera de São Lorenço, Baleia, Juquehi, Camburizinho, Boiçucanga até Maresias. Nosso grupo a XRunner participou com três equipes, uma composta por seis corredores e duas com três cada, eu estava numa dessas.
Chegamos à noite anterior. Esse tipo de prova requer uma logística complexa é necessário apoio de bicicleta para acompanhar o corredor quando o percurso passa por áreas de reserva, onde não é permitida a distribuição de água e isotônico e a circulação de carros. Iniciamos uma reunião, para definir tarefas, que se estendeu por boa parte da noite. Fomos dormir muito tarde. A pousada estava avisada que deveria servir o café da manhã antes das 5h, a largada se daria 7h.
Briefing: ainda no escuro.
Na pousada havia corredores de outras equipes, mas estranhamente, no café da manhã, só encontrei nosso pessoal. Estávamos a cerca de 60 km da largada, em Bertioga, o planejamento previa a saída com uma hora de antecedência, seria o suficiente para distribuir os corredores pelos postos de troca no percurso, deixar os que fariam a largada no Forte de Bertioga e ainda sobraria tempo para fotografar o pessoal passando. Para isso contávamos com uma Van abastecida de água, isotônico, frutas e sanduíches, duas bikes e um carro de passeio.
Claro, não saímos na hora combinada. Depois do café fizemos um brifing, identificamos os carros de apoio com adesivos, providenciados pela organização da prova, colocamos as bikes de apoio na Van, entramos e seguimos para o ponto de largada. Chegamos mais de 20 minutos atrasados.
Eu era um dos que fariam o primeiro trecho. O "tiro" da largada já havia sido dado a muito tempo, nem sinal dos corredores. O local estava no clima. Carros estacionados por toda parte, muita gente vestida de atleta, equipes se organizando para levar seus corredores para os pontos de troca do revezamento. O clima úmido e chuvoso fazia parecer ser mais cedo do que realmente era, mas todos estavam muito animados. Desci da Van ainda em movimento, no meio do trânsito. Comecei correr ali mesmo. Quando cheguei ao local do inicio da prova não encontrei ninguém do apoio, fiquei um tanto perdido, sem saber ao certo o que fazer, corri até o pórtico e nada, até que um outro atrasado, que havia conseguido informação, me viu perdido no meio do caminho e disse que era para ir embora, pois não iriam marcar a saída, o tempo seria contado a partir do tiro de largada.
Larguei do Box. Saí correndo. Olhei pra frente não vi nada, praia vazia, muitas pegadas como se uma manada tivesse passado por ali. Agradeci ao corredor que me ajudou, me despedi por abandoná-lo e fui embora, o último eu já não era.
Bolhas causadas pelo atrito da areia molhada
Do meu grupo éramos dois nesse trecho, iniciamos a prova praticamente juntos, mas ele é bem mais rápido que eu e sumiu na minha frente.
O cenário não era dos mais simpáticos. A praia de Bertioga não é lá uma das mais bacanas do litoral. Praia grande de areia cinza e molhada, com vários veios de água, ou sabe-se lá do que, que vertem em direção ao mar e por vezes formam pequenos córregos. Talvez pelo horário, a praia estava deserta e eu ali, sozinho, triste, correndo feito doido achando que tiraria o atraso. Depois de uns 15 minutos de solidão avistei umas pessoas correndo á frente, imaginei ser essa a sensação de alguém que avista um oásis no deserto. Isso me animou, esse trecho tem uns 11km, dava tempo de passar muita gente, apertei o passo. Quando se participa de provas de corrida o adversário da frente é sempre nosso objetivo. Assim que passamos ele o objetivo passa a ser o próximo. E vamos aos retardatários. Eu já não estava mais entre os últimos, corria agora entre diversas pessoas, assim é melhor. Não sei por que lembrei do Rubinho Barrichello, quando se cruza longas distâncias a cabeça trabalha muito, mas as vezes divaga. Fiquei pensando naquelas corridas de F1 onde os caras largam do box e vão ganhando posições, ai imaginei: será que se chover vai ser melhor para mim?
O esforço para alcançar o grupo intermediário foi grande. A areia daquela praia não é fofa, mas é bem macia e o pé afunda quando damos impulso, além disso, era impossível passar pelos veios d'água sem molhar os pés. Essa combinação pés molhados e atrito, gerado pelo afundamento, propícia formação de bolhas. E isso dói.
Passo mais um grupo, a praia parece não ter fim, mas da pra ver muita gente à frente e isso é animador.
A Van seguiu seu caminho, foi deixando os corredores nos próximos postos de revezamento, o ciclista que deu apoio a equipe passou por mim e eu disse que estava bem, ele seguiu atrás do companheiro que estava a minha frente. Em provas de revezamento o atleta carrega uma pulseira com um chip, que nos postos de troca deve ser registrada pelo equipamento de checagem e passado para o corredor que o substituirá. Eu corria há uns 40 minutos, a praia estava chegando ao fim, já podia ver o pessoal a minha frente fazer uma curva à esquerda saindo em direção ao ponto de troca. Corro sem óculos, isso dificulta a identificação das pessoas que estão muito longe, mas a ansiedade e a vontade de chegar era tanta que vi o pessoal da minha equipe acenando.  Ao me aproximar todos correram comigo até o posto onde registrei a chegada e passei a pulseira para meu companheiro continuar.
Esse tipo de prova traz valor agregado: o relacionamento das pessoas. É uma coisa intensa, não da muito tempo pra pensar, sempre tem alguém correndo e uma porção de tarefas para ser cumprida por quem esta de fora.  A duração da prova é de cerca de 6 horas, as pessoas precisam ser alimentadas e hidratadas, por vezes secas e ter suas roupas trocadas. A distância entre os postos pode chegar a 20k, é necessário deixar um corredor e ir buscar o outro, para deixá-lo num posto de revezamento mais a frente. Tudo tem de ser sincronizado, mesmo assim, ainda da tempo de torcer pelo colega e se preocupar com sua saúde. Até mesmo os adversários são solidários, os mais sofisticados carregam consigo água e suplementação alimentar. É comum vê-los dividindo com quem está ao lado e não tem apoio para suprir essa necessidade.

Trocas feitas, corredor no trecho. A Van nos leva para o próximo ponto. Novamente muitos carros, muita gente vestida de atleta e a muvuca na saída do funil. O local onde é feita a troca dos atletas é demarcado em forma de funil, para que o corredor passe por um sensor que o identifica, registra seu tempo e ele faça a troca de pulseira, na frente dos fiscais. Na entrada ficam os torcedores, membros das equipes que não estão correndo aquele trecho e vieram buscar o corredor, do lado da saída permanece o atleta que vai correr próximo trecho. Depois que a troca é feita todos saem rapidamente em direção a seus carros, para levar quem acabou de chegar a seu novo ponto de largada e resgatar o que acabou de sair. É uma correria deliciosa.
No carro de apoio checamos o tempo na planilha, comemos, hidratamos e tentamos contato com as outras equipes para ver se está tudo bem, se alguém precisa de apoio.
A Van atendeu as três equipes e no decorrer da prova, durante um resgate grande, num trecho mais longo, ficou planejado de voltar para resgatar todos atletas que ficaram pra trás de uma só vez. Não contávamos com o transito e perdemos muito tempo nessa operação. Depois de algumas horas de prova as equipes se espalham pelo percurso tomando todos os pontos de troca. Assim sempre tem carros chegando e saindo com atletas, diferente de quem está na frente que não enfrenta trânsito.
Atrasamos novamente, quem deveríamos esperar para substituir chegou antes de nós e ainda nos esperaram. Vivemos um momento de atabalhoamento. Além de atrasados não encontrávamos o posto de troca, ficamos rodando por Juquehi, quando encontramos o posto havia muito transito e o carro não passava. Saímos correndo pela rua até que a bike nos encontrou e avisou que nossos parceiros já haviam chegado e esperado, mas, como demoramos resolveram seguir. Decidimos ir atrás deles para fazer a troca. De novo pressão e superação. Já tínhamos corrido dois trechos e esse era um dos mais longos.  Rodamos mais rápido, mais uma vez meu colega de equipe foi na frente e sumiu. Era uma subida brava, algum tempo depois encontrei meu parceiro de revezamento, peguei a pulseira e dei linha. Eles ficaram na estrada e o carro de apoio procurando por eles, no ponto de troca. Um dos corredores que não seguiu e faria o próximo trecho, deveria estar num posto a frente para trocar com aquele meu colega rápido. Sem comunicação e com necessidade de ser rápido a criatividade imperou, pararam o primeiro carro de apoio que passou e pediram carona, um foi o outro ficou esperando nossa Van passar para recolocar tudo em ordem novamente.
Minha equipe: Eu (Renato Flôr), Ricardo Ruiz e Paulo Pinheiro


Algumas horas depois trocas feitas e o trecho final com a subida da serra de Maresias recebia a XRunner para o final de mais uma prova, claro que não fomos bem na classificação, mas vencemos nossos desafios e terminamos inteiros e muito felizes. 
Como ninguém é de ferro e corredor precisa de hidratação ...

Ano que vem tem mais. 
Agora, corro pro aeroporto que meu voo sai as 19h30, se não me engano.

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